“A sociedade teve a sua chance!”
Chutando uma bola de futebol americano por volta das três horas e quarenta minutos da tarde do dia 18 de julho de 1984, em San Diego, Califórnia, o garoto Armando Rodriguez, 11 anos, percebeu um Ford Mercury Marquis preto indo em direção ao estacionamento do McDonald’s do outro lado da rua.
O homem que desceu daquele carro intrigou Armando. Vestindo uma calça militar e uma camisa escura, ele carregava uma bolsa. Dentro dela, uma metralhadora Uzi semi-automática 9 milímetros, um rifle Winchester calibre .12, e uma pistola Browning HP.
Segundos depois, as pessoas que estavam dentro do McDonald’s escutariam um grito:
“TODO MUNDO DEITADO!”
Todos que estavam lá dentro obedeceram as ordens. O que o homem queria? Assaltar? Roubar? Não. Ele queria… matar! Sem dizer mais nenhuma palavra, o homem começou a atirar nas pessoas que estavam deitadas perto da porta. E continuou metodicamente atirando em todos que estavam lá dentro enquanto caminhava pelo estabelecimento. Maria Rivera, estava com sua família, dois filhos e o marido, Victor. Ao ver o homem disparando, abraçou seus dois filhos e viu seu marido virar para o homem e implorar para ele parar com aquilo. O atirador se virou para Victor e o atingiu com um tiro, Victor caiu no chão gritando. O homem foi em sua direção e gritou:
“CALE A BOCA!”, e atirou de novo e denovo… 14 vezes.
Jackie Reyes, uma jovem mãe de 18 anos, levou 48 tiros. Seu corpo já sem vida no chão contrastava com o de seu filho, Carlos Reyes, de apenas 8 meses de idade. Ele estava vivo, envolto nos braços da mãe morta. Os sobreviventes que viram aquela cena nunca mais a esqueceriam: com uma pistola 9 milímetros na mão, o atirador mirou e matou o recém-nascido com um tiro nas costas.
Pessoas agonizavam, e o homem voltava em meio às poças de sangue para terminar o serviço. Algumas tentaram fugir e foram atingidas com tiros nas costas. Outras conseguiram sair daquele maldito inferno, mas o homem as perseguiu matando-as no estacionamento. Outras conseguiram fugir e se esconderam atrás de carros.
Omar Hernandez, David Flores e Joshua Coleman, todos amigos de escola, e todos com 11 anos de idade, brincavam do lado de fora quando o massacre começou. Eles correram até suas bicicletas. Mas Omar Hernandez e David Flores caíram mortos. Joshua Coleman, fingindo-se de morto, escapou por um triz e pôde viver sua vida… mulher, filhos…
Alicia Garcia cozinhava quando as balas começaram a ricochetear. Ela e outros dois cozinheiros correram por uma escada até uma sala nos fundos. Ela e outros funcionários do McDonalds conseguiram escapar.
O primeiro carro da polícia chegou às 16 horas e 7 minutos. Imediatamente a polícia de San Diego pediu uma equipe da SWAT.
“Mande a SWAT… mande TODO MUNDO!”, gritou pelo rádio um tenente de polícia ao ser recebido a tiros pelo atirador.
Seis quarteirões ao redor do McDonald’s foram fechados. O que se seguiu a partir daí parecia sair de um filme de Hollywood. Durante uma hora e dezessete minutos o atirador e a polícia travaram um duelo digno de filmes de faroeste. Encurralado dentro do McDonald’s, o atirador em fúria assassina parecia aqueles vilões saídos dos nossos piores pesadelos. Quem seria esse louco?
A sanguinária tarde do dia 18 de julho de 1984 só terminaria quando, às 17 horas e 7 minutos, um atirador de elite da SWAT, mirou seu rifle Remington calibre .308 com mira telescópica, bem no meio do peito do assassino em massa e acertou um tiro em seu coração. Mas a morte do assassino foi apenas o início da tragédia: 21 pessoas mortas e outras 19 feridas. A vítima mais jovem, Carloes Reyes, tinha apenas 8 meses de vida, já Miguel Ulloa, o mais velho, tinha 74 anos.
Não havia dúvidas: aquele McDonald’s havia sido palco do pior assassinato em massa cometido por um indivíduo solitário em toda história americana até então.
O chefe da polícia de San Diego, Bill Kolender, chamou o episódio de:
“…a mais terrível coisa que eu já vi em minha vida e olha que eu já estou nesse negócio a 28 anos”.
Passado o desespero e o terror, veio a famosa pergunta que sempre é feita após esse tipo de episódio e que até hoje ninguém nunca conseguiu responder.
Por quê?
O Atirador
O local do crime é significativo: uma filial suburbana do McDonald’s. Esse típico símbolo norte-americano da família feliz e da satisfação material representava tudo pelo qual James Oliver Huberty tinha lutado tão duramente, e falhado tão miseravelmente, em conseguir.
Sua vida sempre fora dura. O primeiro grande problema pelo qual passou veio já aos 3 anos de idade quando contraiu poliomelite. A doença o fez ser um menino irritadiço, tinha fortes dores e sofria espasmos. Aos 7 anos, James foi abandonado pela mãe, uma fanática religiosa que encontrara Deus e saira em pregação pelos Estados Unidos, abandonando a família. James cresceria culpando Deus pelo abandono da mãe.
O menino solitário tinha como único amigo o seu cão Shep. Ao atingir a adolescência, começou a nutrir um fascínio extremo por armas. No ensino médio conheceu aquela que viria a ser sua esposa, Etna. Ambos se casaram em 1965, quando James tinha 23 anos. Formou-se em sociologia e recebeu uma licença para trabalhar como embalsamador em uma casa funerária. Mas não conseguiu seguir carreira. Segundo Don Williams, patrão de James:
“Ele era um bom embalsamador, mas simplesmente não se relacionava com as pessoas. Por isso era um ótimo embalsamador, pois, simplesmente, ele colocava sua máscara e ia lá para baixo ficar sozinho”.
Pouco tempo depois nasceram as duas filhas do casal e, durante os anos 70, eles pareceram viver felizes,
apesar de James adotar um comportamento bastante arredio.
Na frente da casa da família, uma placa advertia quem passasse.
“Não ultrapasse!”
James trabalhava como soldador em uma metalúrgica e sua existência se resumia à família. Não conversava com mais ninguém tirando sua esposa e duas filhas. Quando interagia com outras pessoas, era porque algo de ruim havia acontecido. Certa vez, um cão defecou em seu gramado. Ele não pensou duas vezes: pegou uma arma e foi atrás do animal para matá-lo. Foi dissuadido por um vizinho, mas sem antes bater boca com o mesmo. Outra vez, quando um vizinho reclamou que o Pastor Alemão de James arranhara seu carro, o estranho homem não disse nada. Voltou para casa e matou seu próprio animal de estimação com um tiro.
Mas não era apenas James quem tinha comportamentos extremos. Sua mulher, Etna, também não era flor que se cheire. Por várias vezes arrumou confusão com vizinhos e a polícia local sempre brincava quando era chamada para verificar alguma ocorrência com o casal:
“Os Hubertys novamente…”
O início da ruína para James Huberty ocorreu com as dificuldades econômicas vindas com a década de 1980. A fábrica onde trabalhava faliu e ele viu-se desempregado. Somente seis meses depois conseguiu uma nova ocupação, mas logo foi despedido. Foi quando ele começou a falar em coisas estranhas: suicídio e coisas piores.
Ele tentou o suicídio, mas foi salvo por Etna, que segurou o seu braço e travou o gatilho com os próprios dedos.
“Quando eu voltei, ele estava sentado no sofá, chorando”, recorda sua esposa.
De acordo com um conhecido, foi por volta dessa época que James começou a expressar pensamentos assustadores:
“Ele dizia que não tinha nenhuma razão para viver, que não tinha emprego nem nada. Dizia que se aquilo fosse o fim da linha e não pudesse mais sustentar a família levaria todo mundo com ele”, disse um ex-colega de trabalho, Terry Kelly.
Como muitos assassinos desequilibrados, James passou a culpar a sociedade por seu fracasso pessoal. Se ele não tinha emprego, isso era culpa de alguém. Em sua mente, ele começou a pensar sobre matar pessoas para vingar sua situação, e ele dizia isso abertamente aos mais próximos. “Atirar em alguém”.
Em setembro de 1983, ele sofreu um acidente de carro que agravou os danos remanescentes da poliomelite. Ele ficou com um constante tremor na mão. Quatro meses depois a família mudou para Tijuana, no México. Depois mudaram novamente para um subúrbio de San Diego. Huberty arranjou emprego como segurança, mas logo foi demitido.
“…instabilidade geral… ele não exercia suas funções de forma adequada”, dizia o registro de sua demissão.
Sem emprego, sua família foi forçada a se mudar repetidas vezes, para apartamentos cada vez mais decadentes. James Huberty começava a entrar em parafuso.
Um dia antes de cometer um dos mais notórios assassinatos em massa da história dos Estados Unidos, James foi até uma clínica psiquiátrica. Erradamente, a recepcionista escreveu “Shouberty” no formulário de admissão. Eles disseram que ligariam de volta para James Huberty, mas essa ligação nunca seria feita.
“Se um psicólogo ou psiquiatra o tivesse atendido, eles poderiam ter-lhe dado algum medicamento”, disse posteriormente sua esposa Etna.
Um dia depois de ir até a clínica psiquiátrica, James Huberty saiu com sua esposa para pagar uma multa de trânsito. O casal almoçou no McDonald’s e visitaram o zoológico de San Diego. Resginado com a vida, James chegava ao fim da linha.
“A sociedade teve a sua chance”, resmungou ele para sua esposa.
Voltaram para casa e quatro horas depois ele vestiu uma calça camuflada e uma camiseta preta.
“Aonde você vai, meu bem?”, perguntou Etna.
“Vou caçar seres humanos”, respondeu James.
Etna achou que aquilo fosse uma piada.
Ele dirigiu até um supermercado e depois até os Correios. Como um lobo, parecia farejar o melhor local para caçar suas presas. Considerando o McDonald’s um alvo melhor, ele desconsiderou as primeiras opções e partiu para cometer um dos piores ataques solitários da história americana. O massacre só parou quando um atirador da SWAT disparou acertando o sombrio coração de James Huberty.
Em luto pela tragédia, por uma semana inteira o McDonald’s suspendeu toda publicidade da empresa. A Burger King, sua rival, também fez o mesmo.
Não havia álcool e nem drogas em seu corpo, mas um número elevado de chumbo e cádmio, provavelmente resultado de 14 anos trabalhando com soldagem.
Dois meses após o ataque o McDonald’s demoliu a loja de fast food e doou o terreno à cidade. Em 1986, Etna Huberty moveu um processo de U$ 5 milhões de dólares contra o McDonald’s e a Babcock and Wilcox (funerária que James havia trabalhado). Ela alegava que o glutamato monossódico presente na comida do primeiro e o ambiente de trabalho do segundo haviam causado delírios e uma incontrolável raiva em seu marido. Ela perdeu a ação.
Um memorial às vítimas foi construído em frente ao lote onde ocorreu o massacre. O memorial é constituído por 21 blocos hexagonais de granito. Velas e flores são sempre vistas no local.
Fonte: O Aprendiz Verde